sexta-feira, 24 de junho de 2011

Divisor de águas

Jorge Luiz da Silva Alves






        Elaine tentou (em vão) distinguir o brilho mais intenso, aquele que faiscava violentamente nos seus olhos ressacados pela formidável surpresa: se do rubilado-trampo (era a hora do almoço), azul-felicidade (ano e meio após o reencontro no pagodão em Madureira),verde-paixão (como o enroscar faminto de quase toda semana) ou o branco-paz, aquela mesma paz que Genésio ofertava-lhe tanto em torpedos adocicados diariamente como na saborosa sessão de penetrações repetidas visceralmente tanto no corpo como na alma. O fascinante coquetel de gemas multicoloridas veio acompanhado dum Merlot aveludado e um sorriso devastador daquele clone do Jim Caviezel – ela, uma Jessica Biel de jaleco , entregue à emoção do pedido tão bem arquitetado, permitiu que uma lágrima de aceitação ferisse-lhe a cútis e revelasse todo apreço pelo amor concedido pelo destino neste recomeço – e pela juíza da 12ª Vara de Família do distrito, ao homologar o fim do seu calvário com um gaúcho insosso e grosseiro, de maus bofes e boa mãozorra canhota. Naquele momento, divisor de águas dos seus trinta e tantos anos, Elaine era a felicidade em pessoa: saltitante, feliz, mulher!


         E quem voltou para o consultório foi a mulher, e não a odontóloga de renomada verve, destaque em conferências, paradigma de correção profissional: a extrema felicidade turvou-lhe o pulso do batente... errando nas miligramas da procaína, encheu a fenda cariada dum paciente (ignotamente) hipertenso com doses acima do suportável por sua enferma constituição, levando-o a um coma...

     ...e quis o bom Deus dos Apaixonados, que o mesmo advogado que a libertara dos tabefes e prepotências do gaúcho fosse também o articulador de sua defesa no Conselho Regional de Odontologia/RJ , absolvendo-a por unanimidade. Num caso raríssimo de aceitação das provas , reforçada com a espetacular peroração do causídico habilidoso, repondo novamente nos céus outrora turbulentos de Elaine o arco-íris da felicidade que escapara-lhe desde o dia mágico do restaurante. Repondo novamente em seu dedo anelar o arco-íris de amor e cumplicidade há tanto aguardado – ele, o Doutor Genésio Frias de Queiroz e a duplamente ressucitada Elaine, num duplo divisor de águas de sua existência.

8 comentários:

  1. Jorge meu amigo, é espantosa a sua capacidade de conduzir "sinteticamente" os seus contos, as histórias paralelas de uma existência e neste especialmente, entre dois momentos tão distintos que culminam em resultados surpreendentes.
    Renovo sempre o meu prazer ao ler seus textos.
    Um abraço, amigo.
    Celêdian

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  2. em emaranhados apanhas palavras e saltitas com elas com maestria perante nossos olhos ávidos! grande abraço

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  3. Jorge onde tu andas? procurei-te pelo Recanto e não mais encontrei. mudou seu perfil? Não te achei também no orkut...o que houve? vi que era seu aniversário,por estes dias e voltei para parabenizá-lo e encontrei tudo vazio...dê notícias. grande abraço

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  4. Muito bem elaborada a crônica, parabéns amigo escritor Jorge.

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  5. ...NADA COMO COMPARTILHAR COM UMA VERDADEIRA OBRA...TEM UMAS AULINHAS PRA MIM?

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  6. ...NADA COMO COMPARTILHAR COM UMA VERDADEIRA OBRA...TEM UMAS AULINHAS PRA MIM?

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  7. Começaria a ter mais cuidados, quando da necessidade de utilizar, procaina na Odontologista... rsrsr
    Bom texto, Jorge Luiz!

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  8. Bom dia Jorge, envolvente e bem escrito texto, parabéns!!Gostei também da fotos! Abraços, Van.

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